O curso livre A arquitetura de Um teto todo seu propõe uma análise do ensaio de Virginia Woolf a partir de sua camada estilística, almejando abordar o contexto político que antecede sua publicação.
Décadas de leitores identificaram-se e apropriaram-se do texto de Virginia Woolf, que se tornou sua não-ficção mais celebrada. Todavia, como indaga Anne Fernald, “por que ele [Um teto todo seu] é levado a nível tão pessoal por tantos leitores, quando é recheado de dispositivos feitos para distanciar Virginia Woolf da voz do ensaio?”.
Investigaremos, portanto, as camadas políticas desses dispositivos e as estruturas por trás da arquitetura aprazível aos olhos de Um teto todo seu.
Em uma série de palestras que precedem a publicação de Um teto todo seu (1929), concedidas a faculdades de mulheres, Virginia Woolf se vê consternada com a “arquitetura institucional: longos corredores, ‘como abóbadas em alguma abominável catedral de igreja alta – assim por diante elas vão, frias e cintilantes – com uma luz queimando’”.
Em contraponto às suntuosas faculdades dos homens, as mulheres lutam para conseguir 30 mil libras para suas instituições. Woolf complementa, no ensaio: “não podemos ter sofás e quartos separados. ‘Os confortos’, afirmou ela, citando um livro ou outro, ‘terão que esperar’”. Analisando, interna e externamente, as universidades, Woolf reflete acerca desses prédios, principalmente de quem pode ou não ter acesso a eles, e os impactos dessa segregação de gênero e classe.
Em resumo, Um teto todo seu compõe-se dos desdobramentos de um argumento: “uma mulher precisa ter dinheiro e um teto todo seu, um espaço próprio, se quiser escrever ficção”. Antes, porém, de argumentar, Virginia Woolf busca compreender os silêncios e vazios do passado das mulheres. Em consequência dessa busca de uma alternativa à tradição patriarcal, Woolf trata a história como uma narrativa tão manipulável quanto a ficção – com a ressalva de que essa última não se põe como verdade absoluta.
Perscrutando um quarto próprio (a room of her own), Virginia Woolf encontra, na ficção, um espaço apenas seu e daquelas relegadas ao exterior das instituições. Ao reservar-se nesse cômodo, considerando que o texto em si funcione como um espaço para discussão, Woolf debruça-se sobre a história das mulheres, a literatura que escreveram, considerações sobre as escritoras de seu tempo, a androginia, e prospectos para o futuro.
Sinto muito a interrupção tão abrupta. Há algum homem no recinto? Vocês me garantem que atrás daquela cortina vermelha não se esconde a figura de Sir Chartres Biron? Somos todas mulheres, vocês me asseguram isso?
A maestria de Virginia Woolf em criar um espaço na ficção para discutir os fatos suscita a necessidade do leitor de explorar os artifícios linguísticos e literários por ela empregados a fim de localizar a concretude das denúncias presentes na argumentação do ensaio. Convidamos você a investigar conosco os aspectos históricos e políticos de Um teto todo seu, ensaio que vem inspirando leitores há décadas.
Tranque as bibliotecas, se quiser; mas não há portões, nem fechaduras, nem cadeados com os quais você conseguirá trancar a liberdade do meu pensamento.
Lucas Leite Borba elaborou o curso A arquitetura de Um Teto Todo Seu no segundo semestre de 2023. Ele é mestrando na área de teoria literária pelo Programa de Pós-graduação em Letras da Universidade Federal de Pernambuco. Dedica-se aos estudos woolfianos desde 2020, quando conheceu a Profa. Dra. Maria Aparecida de Oliveira (UFPB). Organizou, em 2021, junto a Prof. Maria e a Profa. Dra. Patricia Marouvo (UERJ), a obra “A prosa poética de Virginia Woolf”. Integra o grupo de trabalho do projeto Literatura Inglesa Brasil e é membro do KEW – Grupo de Estudos Woolfianos. Sua pesquisa atualmente está voltada para o estudo do romance Entre os atos (1941).